quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Lágrima de crocodilo


No Egipto e na Mesopotâmia o vidro era ainda considerado um sólido. Não há provas de que fosse questionado se as contas, varetas, tigelas, frascos e jarros de vidro tinham a propriedade de ceder a pressões tangenciais ligeiras. No entanto, algumas experiências rigorosas conduzidas na actualidade permitem-nos concluir que o vidro é um líquido.
Todavia, o vidro não é apenas uma substância amorfa e não-cristalina, fundamentalmente composta por sílica. Toda a substância de estrutura não-cristalina dotada de transição vítrea é vidro[1].
O vidro é líquido por não ser dotado de uma transição de fase de primeira ordem, não contendo transformação entre Estados de Equilíbrio Termodinâmico. Consequentemente, este material não foi utilizado como isolante entre Estados durante a Guerra Fria do século XX. A cortina de vidro nunca existiu, mas a cortina de ferro foi uma realidade constatável em dias de céu limpo. Devido à sua fluidez lenta e difícil solidificação, o vidro foi quase exclusivamente utilizado para fabricar lágrimas de crocodilo (que eram adereços femininos, hoje considerados como artigos falsos e de utilidade duvidosa), berlindes (utilizados como moeda entre os séculos XIX e XXII) e, ocasionalmente, lentes para telescópios domésticos refractores[2]. É narrado o uso do vidro para vedar janelas, mas tal aplicação é improvável e a hipótese foi descartada como mito quando, nos anos 80 deste século, arqueólogos japoneses descobriram que se utilizava papel com esse fim.
A transição vítrea permite-nos classificar o vidro como um líquido, facto integralmente observável e directamente corroborado pela experiência: os líquidos adaptam-se à forma que lhes é adjacente, e o vidro de um copo com água adapta-se à forma da água.
A noção contra-intuitiva e errónea de que o vidro é um sólido amorfo constitui um mito urbano alimentado por indivíduos que nunca beberam um copo.


[1] Considera-se erroneamente que certos artigos científicos carecem de transparência, substância e fluidez quando, na realidade, eles possuem uma estrutura não cristalina dotada de transição vítrea. São substâncias vítreas e, portanto, são fluídos e transparentes.
[2] Aparelhos utilizados para «ver estrelas», de acordo com a superstição antiga segundo a qual as estrelas eram enormes corpos celestes incandescentes. Hoje é reconhecido pela comunidade científica que as pancadas na cabeça e a baixa pressão arterial são os meios apropriados para ver estrelas, que constituem uma anomalia da retina conhecida como fosfeno.

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